Novos Povoadores®

Apoiamos a instalação de negócios em territórios rurais

Nascem as cidades inteligentes



No Brasil, ainda estamos na fase de lutar contra o trânsito, as enchentes e os apagões. Mas vários países já começam a materializar as chamadas cidades inteligentes

Enquanto no Brasil a população e as autoridades se debatem com desafios como tentar diminuir as horas que são perdidas no trânsito ou como evitar as tragédias causadas pelas chuvas, um grupo de cidades no mundo alcançou um patamar bem mais elevado de discussão. São lugares que estão sendo erguidos do zero ou metrópoles que já implantaram soluções urbanísticas que hoje são referência no tema cidades do futuro.

Numa delas, em Songdo, na Coreia do Sul, será possível “ir” ao médico ou à escola sem sair de casa. Em King Abdullah, na Arábia Saudita, todos os serviços públicos funcionarão 24 horas por dia e qualquer processo não levará mais do que 60 minutos para ser resolvido.

A cidade-estado de Singapura é literalmente ilhada diante de uma das maiores densidades demográficas do mundo. Mas evoluiu tanto nas soluções para seus dilemas — como eliminar os congestionamentos ou se tornar autossuficiente em água potável — que hoje seu governo virou uma espécie de consultor para outras cidades no mundo que querem ser mais inteligentes.

Esses projetos urbanísticos inovadores são alguns dos exemplos que surgiram nos últimos anos para uma adequação ao fato de que a maioria das pessoas vai se aglomerar cada vez mais em cidades. “Os velhos modelos urbanos não são mais sustentáveis”, diz Ryan Chin, pesquisador do Massachusetts Institute of Technology, nos Estados Unidos. “As cidades inteligentes e os novos modelos que elas estabelecem devem nortear o crescimento nos próximos anos.”

As cidades inteligentes são comunidades que lançam mão do que há de mais moderno em recursos tecnológicos e arquitetônicos como resposta aos desafios impostos pelo adensamento populacional. A ideia é criar ambientes sustentáveis, eficientes, com alto grau de conectividade e, consequentemente, com excelentes níveis de qualidade de vida.

Em um curto espaço de tempo, o conceito de cidades inteligentes extrapolou os meios acadêmicos e o plano da utopia para virar uma nova e lucrativa indústria. De escritórios de design, arquitetura e urbanismo a grandes corporações dos setores de tecnologia e serviços, muitas empresas já possuem unidades de negócios exclusivamente destinadas a pensar nesse tipo de solução. Siemens, IBM, GE, Cisco, entre outras, são algumas das multinacionais que oferecem um volume crescente de projetos, produtos e serviços.

Estima-se que o mercado de soluções inteligentes para cidades já seja de cerca de 1,2 trilhão de dólares. De acordo com um estudo recente da consultoria de gestão Booz&Co., as cidades no mundo devem investir cerca de 37 trilhões de dólares nos próximos 25 anos para modernizar e expandir a infraestrutura.

Não faltam investidores e governos dispostos a aplicar dinheiro no setor. Na Coreia do Sul, já está parcialmente pronta o que será sua cidade mais inteligente, Songdo. O projeto, avaliado em mais de 35 bilhões de dólares, tem conclusão prevista para 2014. A empreiteira americana Gale se comprometeu a construir toda a cidade em troca dos direitos de exploração dos imóveis.
Coube à Cisco, uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, desenvolver as soluções inteligentes que facilitarão a vida dos futuros moradores de Songdo. As redes de telefonia e internet são de última geração e permitirão conexões a velocidades inimagináveis para os padrões brasileiros.

O grande destaque fica por conta de um inovador sistema de telepresença — disponível em todos os apartamentos e salas comerciais — que permite que os moradores façam consultas médicas, assistam a aulas ou participem de reuniões de trabalho sem sair de casa e, portanto, sem pressionar o trânsito ou os sistemas de transporte. “O avanço tecnológico leva a um salto incrível na qualidade de vida”, afirma Paulo Abreu, diretor de inovação da Cisco para a América Latina.

Uma das principais características das cidades inteligentes é a sustentabilidade. Entre os exemplos nesse quesito está a ambiciosa Masdar, em Abu Dabi, nos Emirados Árabes. A cidade deve ser a primeira 100% livre de emissões de dióxido de carbono. Com uma área de 6 quilômetros quadrados e uma população prevista de 40 000 habitantes, Masdar quer ser um laboratório para experimentos com o uso racional da energia.

No início de março, o premiê espanhol José Luis Zapatero esteve na cidade para observar os progressos já alcançados. Os governos dos Emirados Árabes e da Espanha firmaram acordos de cooperação no setor de energia. “Masdar é um dos principais centros mundiais de pesquisa em energias renováveis”, disse Zapatero.

Nem tudo sobre cidades inteligentes se refere a territórios tão futurísticos. As aglomerações urbanas são como organismos vivos e desenvolvem novas necessidades constantemente. O que hoje se convenciona incluir no campo das cidades inteligentes são formas de pensar a vida urbana e o uso das tecnologias que, em alguma medida, sempre estiveram entre as preocupações dos especialistas em urbanismo.

O verdadeiro — e mais importante — desafio é transformar as metrópoles tradicionais em ambientes mais inteligentes. “É muito mais difícil implantar um sistema complexo como o de Songdo ou Masdar numa cidade como São Paulo. Mas a tecnologia pode servir de base para projetos menos sofisticados”, diz Paulo Abreu, da Cisco. Realmente, ainda estamos em outro patamar. Mas não custa começar — já — a mirar o que há de mais inovador. Afinal, mais dia, menos dia, esse futuro terá de chegar também por aqui.

in Exame.com

Portugal integra lista dos melhores destinos mundiais para Outsourcing




A Gartner, uma das principais consultoras mundiais na área das tecnologias de informação, colocou Portugal na lista dos 11 países desenvolvidos a serem ponderados para a realização de outsourcing de tecnologias de informação e processos, logo após uma lista de 30 países dominada pelos mercados emergentes.

Portugal integra, pela primeira vez, a lista dos melhores destinos mundiais para a realização de Outsourcing de tecnologias de informação e processos da consultora Gartner. Esta inclusão surge após as várias acções de promoção do sector desenvolvida pela Associação Portugal Outsourcing, inclusive nos mercados internacionais.



Frederico Moreira Rato, presidente da Portugal Outsourcing salienta que “a entrada do nosso País neste importante ranking da Gartner vem reforçar a nossa visão de que Portugal tem potencial para desenvolver uma nova indústria de serviços exportadora de ponta baseada no Outsourcing de tecnologias de informação e processos. Mas também temos consciência que para entrar no pelotão da frente é necessário uma aposta da Administração Pública nos benefícios que o sector pode oferecer, bem como ultrapassar alguns constrangimentos à actividade, nomeadamente na área laboral e fiscal”.



O ranking da consultora Gartner coloca Portugal entre os 11 países desenvolvidos com mais potencial para operações de offshore (outsourcing para destinos longínquos) e nearshore (outsourcing para mercados de proximidade), logo a seguir a uma lista de 30 países dominados por estados de mercados emergentes.



Na Europa, Portugal é colocado a par de países como a Irlanda, Israel, Irlanda do Norte, Escócia, Espanha e País de Gales. Segunda a Gartner, este conjunto de países tem um ambiente doméstico maduro, com mão-de-obra qualificada nas tecnologias de informação e processos de negócio, infra-estruturas tecnológicas robustas, legislação madura e muitas vezes contam com investimentos significativos de multinacionais prestadoras de serviços. Contudo, estes países frequentemente têm uma performance desfavorável em termos de custos face a mercados emergentes.



Um estudo recente promovido pela Portugal Outsourcing salienta que a competitividade de Portugal como destino de projectos e centros de competências a nível internacional tem vindo a aumentar, o que já se traduziu na captação de importantes projectos e infra-estruturas para Portugal.



O trabalho denominado “Portugal como Destino Internacional de Outsourcing” defende a importância da adopção do outsourcing no Sector Público e a urgência da criação de medidas específicas para o sector, de forma a explorar o potencial demonstrado pelo País e a reforçar a sua competitividade no contexto europeu.



As empresas associadas da Portugal Outsourcing querem captar para o País projectos internacionais que permitam aumentar as exportações de serviços de tecnologia e processos nacionais, tendo como objectivo que o sector venha a alcançar mais de 1.300 milhões de euros em exportações em 2015.



A Portugal Outsourcing estima que o outsourcing de TI e processos em Portugal venha a representar 1,3% do PIB em seis anos, originando ganhos de produtividade anuais para a economia nacional que poderão ser superiores a 1.500 milhões de euros. As empresas associadas acreditam que o seu sector pode criar 12 mil novos empregos líquidos em Portugal nos próximos anos, com importante parte dessa evolução a ser gerada pelo mercado internacional e pela Administração Pública.



O roadshow promovido pela Portugal Outsourcing incluiu, em 2010, uma acção de apresentação em Londres que contou com especialistas nacionais e internacionais, estando previstas mais acções em cidades europeias em 2011. Entre os oradores na apresentação em Londres estiveram António Nogueira Leite, antigo Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, bem como Frederico Moreira Rato, Presidente da Associação Portugal Outsourcing.



A Portugal Outsourcing tem como associados as empresas Accenture, Altran, Capgemini, Deloitte, Everis, Glintt, HP, IBM, Indra, Logica, Mainroad, Novabase, Oni, Portugal Telecom, Reditus, Sibs Processos, Siemens e Xerox. O sector do outsourcing com recurso às tecnologias de informação e comunicação gera mais de 1.000 milhões de euros por ano para a economia nacional, o que representa cerca de 0,66% do PIB.

in Portugal Global

Falta qualificação na onda do desenvolvimento




As cidades do interior paulista, por exemplo, representam com maestria essa rara fatia, atraindo riquezas pelas mãos da fórmula serviços de ponta x tranqüilidade e segurança. Naturalmente, toda essa bonança acaba por alavancar a indústria imobiliária local e, um dos grandes desafios apresentados por esse contexto positivo para o setor é justamente manter o crescimento populacional com garantias consideráveis de emprego e renda.

Hoje, o interior paulista é um País, com PIB superando a casa dos US$ 135 bilhões - 12% maior que o PIB chileno, por exemplo -, respondendo por 44% de todas as riquezas produzidas no Estado de São Paulo e 13% do Brasil. Só nos primeiros cinco meses do ano passado, a região gerou quase 360 mil novos postos de trabalho, número que corresponde a 75% de todos os novos empregos do Estado.

Embora São Paulo concentre mais de 60% das cidades médias que crescem por meio de atividades educacionais (o Estado é responsável por um quarto de toda a produção científica nacional, abrigando importantes instituições de ensino superior brasileiras), sua indústria imobiliária não está livre de um flagelo comum: a falta de profissionais qualificados.

Em décadas anteriores, imperavam no mercado a baixa produtividade, o pouco cuidado com a segurança, o uso de equipamentos rudimentares e a mão de obra pouco qualificada. Hoje, o sucesso de um produto depende da qualidade de todos os elos da construção civil. Para isso, a mão de obra passou a ser mais qualificada e novas regras surgiram para controlar os procedimentos.

Estamos no auge de um período produtivo, mas, como manter esse cenário, sem considerarmos a importância crescente da formação profissional? A verdade é que o forte momento da construção civil contrasta com a pequena quantidade de profissionais qualificados. Tanto mais quando assistimos à decolagem do programa Minha Casa, Minha Vida, que aumentou sensivelmente a quantidade de projetos, à consolidação das políticas de crédito imobiliário, ao advento do pré-sal, que movimenta sobremaneira a Baixada Santista, ou mesmo a toda a demanda, em breve, gerada pela Copa do Mundo e pelas Olimpíadas.

Todos sabem que a indústria imobiliária nacional já é uma das principais responsáveis pela geração recorde de empregos com carteira assinada (vide estudos do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – Caged – do Ministério do Trabalho). Mas, quando o empresário do setor implementa uma grande obra, que requer investimento elevado, cada vez menos encontra qualidade no momento da contratação.

Para reforçar a tese, recente levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), revela que o custo da produção aumentou muito em função dos altos salários exigidos pelos poucos e bons profissionais. Apesar de tudo, em 2010 a maioria das empresas imobiliárias do Estado trabalhou em ritmo acelerado e com número de empregados crescente. E assim deve ser também ao longo de 2011.

Essa realidade também é detectada em cidades como Sorocaba, Campinas, Jundiaí, Taubaté e São José dos Campos, que, dentre outras, apesar dessa dificuldade avançam nos investimentos, não só no âmbito empresarial, mas também no sentido de reunir esforços e instituir parcerias com entidades afins, rumo à promoção do aperfeiçoamento e formação profissional.

O processo de capacitação é essencial e deve ocorrer o mais rápido possível. Com a rotatividade de profissionais no setor, as empresas deverão cultivar uma visão autocrítica sobre o clima organizacional e criar uma relação de confiabilidade, inclusive a partir das experiências e vivências de cada um.

A escassez de mão de obra é um contexto que deve perdurar por algum tempo ainda, já que a formação de profissionais requer investimento de mais longo prazo. É preciso reinventar a empresa, quando a realidade muda, e avançar com mais afinco no setor da educação, para não desperdiçarmos esse momento de ouro.

in INCorporativa, Flávio Amary, vice-presidente do Interior do Secovi-SP

Desemprego jovem atingiu em 2009 máximo histórico

A taxa mundial de desemprego jovem atingiu em 2009 o nível mais alto de sempre 13% e deverá aumentar este ano, revela um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A taxa mundial de desemprego jovem atingiu em 2009 o nível mais alto da história - 13%, correspondentes a 81 milhões de pessoas - e deverá ainda aumentar este ano, segundo um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A divulgar no âmbito do lançamento do Ano Internacional da Juventude das Nações Unidas, o trabalho refere que, no final de 2009, 81 dos 620 milhões de jovens economicamente ativos entre os 15 e os 24 anos estavam desempregados.

Face a 2007, houve um aumento de 7,8 milhões de jovens desempregados (1,1 milhões em 2007/2008 e 6,7 milhões em 2008/2009), com a taxa de desemprego neste segmento a subir de 11,9 para 13% entre 2007 e 2009.

Comparativamente, nos 10 anos que antecederam a crise económica (de 1996/97 A 200/07) o ritmo de crescimento anual dos jovens desempregados ficou-se pelos cerca de 191 mil.

Em termos percentuais, o aumento de um ponto percentual registado entre 2008 e 2009 na taxa de desemprego jovem representa a maior variação anual dos últimos 20 anos e reverteu a tendência anterior à crise que apontava para uma diminuição das taxas de desemprego jovem desde 2002.

Segundo as principais conclusões do estudo, entre 2008 e 2009 o número de jovens desempregados aumentou 9%, o que compara com um aumento de 14,6% no número de adultos desempregados, mas em termos de taxa de desemprego o impacto sobre os jovens foi maior, subindo um ponto percentual contra 0,5 pontos nos adultos durante 2008/09.

De acordo com a OIT, em 2008 os jovens representavam 24% dos trabalhadores pobres no mundo e 18,1% do total de desempregados a nível mundial.
Mulheres são mais atingidas

Do trabalho resulta ainda que as mulheres jovens têm maiores dificuldades que os homens em encontrar emprego: em 2009 a taxa de desemprego juvenil feminina foi de 13,2%, contra 12,9% nos homens.

As projeções da OIT apontam para uma recuperação do emprego mais lenta para os jovens do que para os adultos, antecipando-se um aumento contínuo do desemprego juvenil mundial este ano até ao nível histórico de 81,2 milhões e uma taxa de 13,1%. Só durante o ano seguinte o número de jovens desempregados deverá cair para 78,5 milhões e uma taxa de 12,7%.

Já a taxa de desemprego entre os adultos terá já alcançado o seu nível máximo em 2009 (4,9%), devendo recuar 0,1 pontos percentuais quer em 2010, quer em 2011.

Intitulado "Tendências Mundiais do Emprego Jovem 2010", o relatório da OIT apresenta as tendências do emprego de jovens entre os 15 e os 24 anos a nível mundial e regional, com especial enfoque para o impacto da crise económica sobre este grupo.

in Expresso

Reflexões Urbanas



Ouves o despertador no telemóvel que colocas na mesinha de cabeceira. É cedo para ti e para o amanhecer, que ainda está a alguns minutos de distância. Não te custa sair da cama, mais do que te tem custado há 20 ou 25 anos. Os chinelos mudam, o soalho muda, o caminho para a casa de banho muda, até o número de pessoas em casa muda. Só a luta continua a mesma. Estás mais pesado, mais caído. Não tens o assobio de outrora. Preparas os miúdos, fazes mais de cem tarefas em pouco mais de sessenta minutos e já nem dás por isso. Respondes maquinalmente às perguntas dos teus filhos, que ainda não sabem ver as horas. Pensas meia dúzia de segundos no saldo que terás na conta bancária. Nos dias que faltam para o final do mês. Nas despesas. Toca a campainha do micro-ondas. Mais uns segundos a fazeres contas de cabeça sobre o tempo que tens, o caminho que tomarás, o trânsito e quanto levarás a chegar ao emprego. Quase ao mesmo tempo a torradeira cospe uma fatia de pão. Acabou-se o luxo de perder segundos a pensar. A partir daqui é tudo um reboliço. Devias levantar-te 15 minutos mais cedo. Há anos que sabes que devias. Mas não levantas. É a tua última peça de resistência. Ninguém te tira esses 15 minutos de sono, até porque já não tens mais nada. Sais de casa na correria habitual, a apressar os miúdos. Tudo em direção ao elevador. Pressionas o botão que um deles já pressionou. Levas os bolsos cheios: telemóvel, chave do carro, chave de casa, carteira e um sem número de extras que muda todos os dias e que não houve tempo de empurrar para dentro da mala – empurras depois, quando estiveres a sair do carro para subir para a empresa. Passas pela escola, deixas os miúdos. Beijas testas a correr, dás abraços de robot e à saída voltas a saudar os auxiliares (que no teu tempo se chamavam contínuos) com o mesmo entusiasmo da mensagem pré-gravada que as operadoras de telemóvel têm a avisar que quem tentaste contactar está de momento indisponível. Enfias-te nas entranhas do carro outra vez. Os rins já acusam cansaço e ainda agora é de manhã. Arrancas. Ligas o rádio e ouves as notícias do dia, que podiam muito bem ser as do dia anterior que nem davas por nada. Ouves a informação de trânsito e ficas a saber onde ele está pior quando já te encontras a entrar na fila que serpenteia a estrada que fazes todos os dias. Não podes ir mais depressa. É aí que abrandas e percebes que não devias ter respondido maquinalmente aos miúdos, que os devias ter beijado melhor e abraçado como se fosse a última vez, pois não sabes quando foi a última vez que realmente o fizeste assim. Sentes uma impressão no estômago. Chama-se saudade e já só te é permitido tê-la enquanto estás numa fila de trânsito. Uma horas depois estás a subir para o escritório. Chegaste à linha da frente e dela sairás ao fim da tarde – depois de teres feito mais de cem tarefas em pouco mais de cada sessenta minutos ali passados. Com a mesma correria voltas ao carro e nem na fila para casa te passa pela cabeça que há anos que estás a cair como um soldado desconhecido. Ainda te sobram munições? Usa-as para festejar a deserção. Acorda amanhã sem despertador, 15 minutos mais tarde, com a luz do dia a beijar-te o rosto, abraça a miudagem a valer. Pega no carro e neles e faz o caminho contrário à fila, aquele que está quase vazio. Conduz muito nesse sentido. Muito. Muito. Depois disso, assobia. 11/03/2011 - 11h07 - Fundação Champalimaud, “Champalimaud Centre for the Unknown”, Av. Brasília, Lisboa.

in projecto Moboide (Mobile Polaroid), Miguel Martins

PlanIT Valley quer ser a montra do urbanismo sustentável



Numa área de 17 quilómetros quadrados no concelho de Paredes está a ser pensada a cidade do futuro, com respostas aos actuais desafios da vida urbana. Soluções que poderão ser exportadas se o projecto, extremamente ambicioso, se concretizar. Por Luísa Pinto

As revistas internacionais chamam-lhe cidade do futuro. Mas o que os promotores do PlanIT Valley, um projecto anunciado para Paredes, estão a tentar fazer é construir de raiz uma cidade para 225 mil pessoas com uma pegada ecológica próxima do zero, que integre as soluções para muitos dos problemas urbanos do presente. Mais de metade da população mundial vive actualmente em cidades, e a sustentabilidade do planeta depende, e muito, das respostas aos desafios associados à sustentabilidade ambiental. O que a Living PlanIT, uma empresa liderada por um ex-executivo da Microsoft, Steve Lewis, se propõe desenvolver é uma espécie de cidade-laboratório onde se desenvolvam e testem soluções. Uma cidade-catálogo, montra de tecnologias, bens e serviços exportáveis para o mundo.

A concretizarem-se os anúncios que têm vindo a ser feitos pela Living PlanIT, será a vinte quilómetros do Porto que vai aparecer um laboratório vivo onde novas soluções tecnológicas irão ser desenvolvidas e testadas, ao nível da construção de edifícios, da mobilidade, da produção e gestão da energia, do tratamento e reaproveitamento de resíduos... tudo controlado por uma gigantesca rede de sensores (fala-se em cem milhões) que permitem, além disso, monitorizar a qualidade de vida dos habitantes, e trazer interactividade à vida.A relação do habitante com esta cidade não seria muito diferente daquela que, individualmente, cada cidadão pode ter com o seu smartphone. O que se fala para Paredes é isso, uma smart city. Uma cidade inteligente que, segundo Celso Ferreira, o presidente da Câmara de Paredes, que abriu os braços a este projecto, não poderia ser desenvolvido em nenhuma metrópole já consolidada. "Nenhum condomínio iria permitir, de repente, a instalação de sensores... e aqui estamos a falar à escala de quarteirões e de cidade. Aqui estamos a começar do zero, e só vem para cá quem aceita estes princípios que, obviamente, não deixarão de respeitar todas as questões legais", explica o autarca.

Trata-se, pois, de construir uma cidade de raiz, com Celso Ferreira a garantir o cumprimento dos critérios de ordenamento do território nacional. "Não vamos repetir, em Paredes, os erros que foram feitos no passado, um pouco por todo o país", assegura. O responsável do projecto, Steve Lewis, garante também ter a preocupação de construir em Portugal algo que não seja "desgarrado da realidade e da cultura portuguesa". Por isso, assegura, chamou o gabinete de arquitectura Balonas e Menano a desenhar o plano de implantação da cidade. "Um gabinete de topo, com soluções inovadoras e criativas", assevera Lewis.

Pedro Balonas agradece a oportunidade de estar "a integrar uma rede de conhecimento". "Temos estado em contacto com um impressionante número de empresas, e a trabalhar em soluções que nos atiram para os lugares de topo, a nível mundial", afirma, entusiasmado, o arquitecto. A Balonas e Menano é parceira e investidora: é o gabinete de arquitectura que está a suportar os custos de investigação nestes processos, onde actualmente estão a trabalhar, afirma Pedro Balonas, 20 pessoas.

Este é o conceito que foi tornado público, e o modelo de negócio que o sustenta: as empresas interessadas em desenvolver tecnologia e soluções, nas mais variadas áreas, como materiais científicos, técnicas de construção, engenharia mecânica, indústria automóvel, software, electrónica, etc, são convidadas a integrar um "ecossistema" de parcerias, tornando-se elas próprias investidoras. "O parceiro da Living PlanIT terá necessariamente de se instalar na PlanIT Valley, e levar os seus funcionários para testar as soluções e desenvolvê-las ali. E depois vendê-las", explica Steve Lewis.

Moradores chegam este ano

Conceito conhecido e publicado, tudo o resto permanece no segredo dos deuses. E nos últimos dois anos tem-se assistido a uma sucessão de números e anúncios, relativamente às empresas envolvidas e contactadas, e ao avanço, no terreno, desta construção.

Ao Cidades, Steve Lewis avança as mais recentes. Até ao fim deste mês, inicio do próximo, deverão começar a ser adquiridas algumas parcelas de terreno (os 17 quilómetros quadrados reservados para o projecto são propriedade privada). E até ao fim do ano poderão começar a chegar os primeiros dos oito mil novos habitantes (entre funcionários de empresas e seus familiares). Lewis garante que já mais de 900 empresas visitaram Portugal nos últimos dois anos, e que nos próximos cinco é muito provável que se instalem em Portugal 1300 "pequenas, médias e grandes" firmas das mais diversas áreas de actuação.

O investimento previsto para a execução deste projecto chega aos dez mil milhões de euros, para dotar esta smart city da capacidade de atrair, directa ou indirectamente, cerca de 12 mil empresas do sector tecnológico e criar cerca de 20.000 empregos. Para a concretização do projecto, não há datas. Os compromissos, para já, circunscrevem-se ao que chama a Fase 1: um investimento de cerca de 500 milhões de euros, só para a parte da construção e das infra-estruturas numa área de 37 hectares. A componente tecnológica - nomeadamente o Centro de Inovação Global para Sensores de Redes e a respectiva rede de sensores a instalar pela Cisco Systems, custarão mais 200 milhões.

Steve Lewis esbanja elogios para todos os protagonistas portugueses que, a dada altura, tomaram contacto e decisões relativamente ao projecto, que anda a ser trabalhado e pensado desde 2007. Começa na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte (CCDRN), que acompanhou o projecto, e segue para a agência para a promoção do investimento (AICEP) e para o seu presidente, Basílio Horta. A primeira pelo auxílio do trabalho técnico, o segundo por ter dado "um apoio soberbo", e ter uma visão" muito prática, muito focada".

O presidente da Living PlanIT prossegue os elogios para o Governo português, que, alega, fez "o que se espera para um projecto deste tipo: saiu do caminho, não atrapalhou". Mas, acrescenta o presidente executivo da Living PlanIT, fez exigências que permitiram melhorar o projecto, em termos de incorporação nacional, de criação de postos de trabalho.

Segundo a AICEP, o projecto PlanIT Valley garantiu a dinamização de um cluster regional de PME da area tecnológica. Como contrapartida, terá facilidades administrativas e fiscais que merece um empreendimento com o selo PIN - Projecto de Interesse Nacional, concedido em Setembro de 2009. Questionada pelo Cidades, fonte oficial da AICEP sublinhou o carácter inovador do projecto, acreditando que os parceiros que já foram anunciados publicamente pelos promotores, e que são liderados pela Cisco, lhe conferem a "credibilidade" que poderá tornar possível o seu sucesso.

O maior dos elogios dispensados por Steve Lewis vai, no entanto, para o autarca de Paredes: "Não há muitos Celsos Ferreiras no mundo, homens com esta visão", argumenta. Para Lewis, "uma das maiores vantagens de Portugal é o facto de os autarcas terem poderes de decisão, de facto". "E isso não acontece em muitos outros países", assegura.

O que é que Paredes tem?

O presidente da Câmara de Paredes relata a "conquista" deste projecto para Portugal como algo que foi muito trabalhado, e que resultou de uma prospecção de indústrias que pudessem instalar-se no concelho e diversificar a oferta produtiva, muito concentrada no mobiliário. "Encetámos contactos com a indústria automóvel, queríamos trazer para o concelho indústrias de nicho. Foi aí que chegámos a Miguel Rodrigues, o autor do Vinci GT", explica o autarca, referindo-se ao carro desportivo que foi desenvolvido no Centro para a Excelência e Inovação da Industria Automóvel (CEIIA), instalado no TecMaia. O carro não chegou à produção industrial, mas em vez de perder uma fábrica, Paredes acabou de ganhar a promessa de "uma cidade".

A Living PlanIT portuguesa é uma empresa com sede na Maia, da qual Miguel Rodrigues é sócio, e que tem como sócio maioritário Steve Lewis. A informação disponibilizada no Portal de Justiça revela uma empresa constituída com cinco mil euros de capital, tendo como actividade os "serviços de diversão e recreio", e com apenas um funcionário. Lewis diz ao PÚBLICO que, na fase actual, os funcionários são já 130, e que a maior parte deles trabalha em Portugal. "Mas o número de pessoas que, de alguma forma, está a trabalhar neste projecto, numa base diária, em todo o mundo, chega já às 2000", assegura.

O líder do PlanIT Valley sublinha que não está à frente de uma empresa de imobiliária, nem de uma empresa de construção - "a Living planIT é uma empresa que desenvolve tecnologias inovadoras, e sustentáveis, à escala urbana", define - mas que chamou algumas das líderes mundiais destes sectores para a rede de parceiros. Por um lado, celebrou um acordo com a Quintain, uma empresa do sector imobiliário que está a desenvolver projectos de regeneração urbana no centro de Londres e que investe muito na investigação e desenvolvimento de novas urbes. Por outro, tem também como parceiro a BuroHappold, uma importante empresa de engenharia, que está a desenvolver projectos de construção em vários pontos do globo.

"A nossa preocupação foi captar o interesse destas grandes empresas internacionais, que, pela sua capacidade e liderança, servirão como âncora para atrair outras empresas", afirma Steve Lewis. Apesar de varias tentativas, o PÚBLICO não encontrou empresas nem funcionários disponíveis para revelar as frentes em que estão a trabalhar. O segredo é a alma do negócio, e o momento actual, garante Lewis, é o do sprint final: "Está muita gente a correr para a meta, ao mesmo tempo".

Celso Ferreira explicou ao PÚBLICO que para evitar possíveis especulações dos proprietários, tem três localizações distintas por onde o projecto pode avançar. "Já há negociações no terreno, e a estratégia é a de que, quando percebermos em qual das três localizações é mais vantajoso, economicamente, avançar, iniciamos as transacções", justifica. O município ainda não fez nenhuma compra, mas já tem um empréstimo negociado. "É a Agência Municipal quem compra o terreno, e depois é ressarcida pela Living PlanIT desse valor", explica o autarca. Que valor? Celso Ferreira diz que não pode dizer, "por razões óbvias".

Óbvia também é a dificuldade de concretizar um projecto com esta envergadura e este grau de integração dos parceiros a envolver. Mas o certo é que, se os planos de Lewis e dos que o acompanham ultrapassarem o entusiasmo que o inglês coloca em cada palavra, para se tornarem, de facto, uma cidade, haverá em Portugal um sítio onde o planeta pode observar propostas para novas formas de trabalhar, habitar, num mesmo espaço. Um lugar em que, por exemplo, os computadores nos ajudarão nas tarefas diárias, dizendo-nos para o telemóvel que a loja por onde estamos a passar, no caminho a pé para o trabalho, tem o produto que nos falta num armário da despensa de casa. E este serviço até já está a ser trabalhado, como solução a comercializar, por uma empresa portuguesa, assinala um não menos entusiasmado presidente da Câmara de Paredes. Steve Lewis, presidente da Living PlanIT

in Público

Cinco passos para uma agenda?

Aderir ao movimento e exercer cidadania requer, igualmente, mobilização e participação. E também alguma organização, pelo que estão definidos cinco passos que podem conduzir à elaboração de uma agenda local, no âmbito do "Cidades pela Retoma".

1. Siga a campanha através do site noeconomicrecovery withoutcities.blogs.sapo.pt, no Facebook (facebook.com/cidadespelaretoma) ou inscrevendo-se na mailing list (groups.google.pt/group/cidadespelaretoma).

2. Organize um grupo. Marque um encontro preliminar com pessoas da mesma cidade. É importante levar conhecimento técnico e científico para o processo de reflexão. Cative alguém dos quadrantes de economia, cultura, terceiro sector, ensino, saúde, política e media que possam ajudar no lançamento da ideia.

3. Crie um blogue/site para informar a comunidade sobre a ideia.

4. Promova conversas informais sobre o papel da cidade na retoma.

5. Produza uma agenda local para a retoma económica e a animação social da cidade.

IDM http://www.drummajorinstitute.org

Emerald Cities http://www.emeraldcities.org

Core Cities http://www.corecities.com/home

AcdPorto http://networkedblogs.com/anEmX

Faro1540 www.faro1540.org

C.F.

in Público

"Há risco de favelas à volta de Lisboa"



Correio da Manhã – Qual a função do Sistema de Segurança Interna?

Mário Mendes – O Sistema de Sistema Interna (SSI) pretendeu colmatar a questão da diversidade de tutelas nas diferentes forças e serviços de segurança. Diversas forças de segurança é uma fonte de descoordenação e criou-se este chapéu que seria o ponto fulcral da coordenação. A função fundamental do SSI é fomentar uma cultura de coordenação e cooperação.

– O secretário-geral do SSI tem os poderes suficientes para desempenhar o cargo com eficácia?

– O problema é este, a nossa Lei de Segurança Interna não dá poderes efectivos ao secretário-geral. Imaginemos que ocorre um aumento significativo da criminalidade no Algarve e em zonas da competência da GNR. Eu digo ao senhor comandante-geral que estou preocupado e para fazer o favor de aumentar as acções policiais em certas zonas. E ele responde: ‘Não, o senhor está enganado, porque aqui não se passa nada de extraordinário’. O secretário-geral fica desarmado. Não pode ser assim.

– O secretário-geral do SSI não tem acesso a informação policial?

– No caso concreto, por exemplo, dos recentes assaltos a ourivesarias, nós sabemos que existem grupos criminosos a trabalhar nisto. O meu colega espanhol – e estamos perante grupos de criminalidade transnacional – sabe quem são os grupos, sabe de onde vêm e para onde vão, em que carros se movimentam, eu não tenho nada.

– Porquê?

– Não posso, porque a lei não o permite. Não faz sentido nenhum.

– Há um problema crónico das forças de segurança que é a ausência de partilha de informação. Consegue que as diferentes polícias troquem informações?

– Estamos longe do óptimo. Há maior cultura, mas é óbvio que não estamos, nem de perto nem de longe, no nível desejável. Mas nota-se muito nas equipas mistas de prevenção criminal que se troca esse tipo de informação. É esta partilha de informação que deve acontecer.

– Mas já há partilha de informações?

– Sabe que está na própria natureza do povo português jogar muito para dentro e guardar aquilo que é seu. É muito difícil transformar de um momento para o outro esse tipo de mentalidade.

– As alterações ao Código do Processo Penal em 2007 contribuíram para o agravamento da insegurança em Portugal?

– Do ponto de vista imediato, tiveram uma manifesta importância. Isso viu-se na subida de criminalidade. Principalmente no segundo semestre de 2009. Foi uma consequência não tanto do Código, mas da interpretação de algumas disposições do Código. É preciso ter algum cuidado na permissividade de certo tipo de legislação.

– Existe uma tendência para mais focos de tensão social?

– Sem dúvida nenhuma. Estou convencido de que 2011 não vai ser tão sensível em termos de aumento exponencial de criminalidade. Vai ser em termos de convulsão social.

– Quais são as maiores ameaças?

– As maiores ameaças em termos de criminologia são mais ou menos as mesmas nos últimos dez anos. Nós fizemos um estudo da evolução da criminalidade na última década e os crimes estão muito associados à toxicodependência que, longe de se ter reduzido, é um fenómeno com o qual a sociedade se habituou a conviver. Habituámo-nos a conviver com a toxicodependência, já não nos choca. É esse tipo de crime, o furto em interior de veículo, o roubo por esticão, o furto na rua, o roubo – e o resultante das relações interpessoais, a difamação, a ofensa corporal simples. Isto corresponde a uma fatia de mais de 50 por cento da criminalidade em Portugal.

– E para o futuro próximo?

– Eu acautelaria em termos de futuro a evolução deste pequeno crime para um crime mais grave e mais violento, o permanente agravamento da situação nas chamadas zonas urbanas sensíveis. Repare que a diminuição eventual das prestações sociais pode acarretar problemas graves nessas zonas, que já têm muitas dificuldades em termos económicos...

– Vai haver mais crimes por razões económicas e sociais?

– Exacto. Pode ocorrer, sobretudo, nessas zonas urbanas sensíveis. Teremos de contar, ainda, com o descontrolo completo que está a haver na União Europeia, não é só um problema nosso, em termos de circulação de pessoas. Está a assistir-se a algo perfeitamente descontrolado. Aquelas medidas compensatórias da livre circulação, as chamadas medidas de Schengen, não estão a funcionar eficazmente.

– Sente que há falta de autoridade do Estado?

– De uma forma genérica, é óbvio que há uma manifesta falta de autoridade do Estado. Há uma fragilidade e uma fragilização das instituições. De todas. Estão frágeis as polícias, estão frágeis os tribunais. Creio que a opinião das pessoas sobre o poder político não é a melhor, mas posso estar enganado. Tudo o que é instituição está desacreditado. Nalguns casos não sei se intencionalmente desacreditado. Em relação ao caso concreto que me coloca: não é para sacudir a água do capote, mas não tive nada a ver com esse assunto.

– Os blindados são necessários?

– Eu acho que sim. Vivi alguns anos em Bruxelas e o patrulhamento de toda a zona sensível era feito com apoio e utilização deste tipo de viaturas. Não é nada de inédito. Em 1995, quando saí da PJ, no relatório anual que fiz em relação a 94, chamei a atenção para as chamadas "zonas urbanas sensíveis" e para o problema da ‘favelização’ da cintura de Lisboa. Na altura, julgo que me chamaram meio maluco, que não devia saber do que estava a falar. Mas eu não sei se qualquer dia esse problema não se vai colocar e se não será idêntico, em ponto pequeno, à da favela do Alemão...

– Há o risco de ‘favelização’ à volta de Lisboa?

– Há. Embora nos últimos tempos tenha havido alguma tentativa de minorar essas questões através dos chamados contratos locais de segurança, que os franceses experimentaram e já abandonaram. Essas zonas têm uma percentagem elevada de população que tem sobrevivido à custa de prestações sociais. E eu não sei até quando é que o Estado aguenta as prestações sociais. E o que é que vai acontecer se essas pessoas perderem as prestações sociais?

– Há uma tendência para o crescimento da criminalidade transnacional organizada. As polícias estão preparadas para esse tipo de criminalidade, que no nosso país é ainda desconhecida?

– Transmito isto com satisfação: nós hoje estamos muito bem apetrechados para lidar com este tipo de fenómeno. Curiosamente, estamos muito menos habilitados – e isto é quase paradoxal – para lidar com outro tipo de fenómeno que é a criminalidade desorganizada, o problema do dia-a-dia, de pequenos grupos que se juntam, sem qualquer afinidade entre eles, e praticam meia dúzia de crimes com uma violência perfeitamente desproporcionada em relação aos fins que pretendem atingir...

– Assaltos a à mão armada a bombas de gasolina para roubar escassos euros?

– E assaltos a residências. Recebi aqui uma mensagem de uma situação ocorrida na zona das Caldas da Rainha, de uma senhora de 90 anos a quem roubaram de casa cento e tantos euros – e que foi barbaramente agredida. Nós não estávamos habituados a este tipo de situação irracional. E é este tipo de criminalidade que nós não podemos deixar de ter em vista. Hoje em dia, não nos podemos esquecer, já há criminalidade por ‘outsourcing’, parte-se muito do conceito brasileiro.

– E o que é essa criminalidade por ‘outsourcing’?

– Uma pessoa quer praticar um crime, contrata meia dúzia de miúdos: tu vais ali, assaltas aqueles tipos e trazes...

– Já há casos desses?

– Já há casos desses.

– Perante este quadro que está a traçar, porque é que sai se ainda há tanto por fazer?

– Creio que há pessoas muito mais capazes e muito mais novas. Foi uma decisão puramente pessoal. Decidi ao fim de muitos anos dizer que já dei o suficiente para este peditório. Agora, vou descansar.

– Sentiu colaboração do ministro da Administração Interna, o Governo ouvia-o?

– Não muito. Não sei se tanto como deviam. Embora o problema seja mais deles do que meu.

– Sai desiludido com o ministro?

– Não, senão já me tinha desiludido há muito tempo. Não.

– Não foi ouvido tanto como desejaria. O Governo e o primeiro-ministro não o ouviram?

– As pessoas ainda não percepcionaram suficientemente a dimensão dos problemas que existem, provavelmente por estarem ocupadas com problemas de natureza mais imediata. Também compreendo que não estão criadas as condições políticas para nenhuma reforma de fundo. É escusado pensarmos nisso. Mas a pessoa que me vier substituir tem de ter um apoio que eu não tive.

– Prevê, então, um agravamento da insegurança...

– Prevejo um agravamento da situação. Com aquilo que adivinho em relação à situação do País, será desejável que a pessoa que venha para este cargo tenha a percepção da realidade das coisas desde o início do ano.

"ASAE E SEF DEVIAM INTEGRAR-SE NAS POLÍCIAS"

CM – Não faria sentido uma polícia única?

M.M. – É uma questão que se tem colocado em diversos países. Por exemplo, a Bélgica, que é um país que seguiu o nosso sistema, já evoluiu para a polícia única. Estamos a falar de um país com uma dimensão aproximada da nossa, quer em termos de território, quer em termos de população. Julgo que não é uma solução desejável.

– Porquê?

– Defendo a manutenção de um sistema dual, com uma polícia civil, sobretudo para a área específica da investigação criminal, e uma polícia de tipo GNR para determinadas operações de natureza mais militar. O que defendo é que entre estas duas forças, entre uma polícia civil e uma GNR, não devem persistir competências em razão do território. Deveria haver uma divisão de competências em razão da matéria.

– Precisamos mesmo de todas estas polícias?

– Há ainda o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), a ASAE, a Polícia Marítima... Há uma dispersão, se for na praia é a Polícia Marítima, mas se for no passeio é a GNR. No mundo actual não faz sentido...

– O que é que seria desejável?

– Seria a criação de um sistema idêntico ao espanhol. Um sistema dual. Como têm os franceses também. No sistema francês, a Polícia Judiciária ficou como um corpo especial dentro da polícia nacional.

– Com uma cabeça comum...

– Sim, com uma cabeça comum. Há uma outra coisa que tenho notado, esta dispersão, com a existência de uma ASAE ou de um SEF autónomos, de uma Polícia Marítima com funções criminais. Não seria muito mais fácil de gerir, mais eficaz e mais racional se estas entidades com competências específicas em determinadas matérias fossem corpos especiais dentro de corpos policiais gerais...

– Será possível um dia?

– Oxalá aconteça o mais depressa possível.

– A ASAE e o SEF não fazem sentido?

– Têm toda a razão de ser. Não sei é se devem ser entidades autónomas. Podiam estar junto de uma polícia.

"QUEM EXERCER O CARGO TEM DE TER MAIS PODERES"

CM – Seja quem for, poderia utilizar o cargo de secretário--geral no mau sentido?

M. M. – Não, não pode. Sempre achei que havia um erro muito grande ao dizer isso sobre este lugar...

– Nunca se sentiu uma espécie de ‘cardeal Richelieu’ do regime?

– Não, nem tenho vocação nenhuma. Na primeira entrevista que dei, colocaram-me a questão dos poderes a mais. Eu disse que depois de ver as coisas e ter lido bem a lei fiquei convencido de que tinha era poderes a menos. Cada vez me convenço mais de que quem exercer o cargo tem de ter mais poderes.

"FIZEMOS MOTOR DE BUSCA PARA TODAS AS POLÍCIAS"

CM – O que mais se orgulha de ter feito e o que ficou por fazer?

M. M. – O projecto de interoperabilidade das bases de dados das forças de segurança. Até Março de 2012, está em prática...

– É uma base de dados?

– Assegura o cruzamento de informações. É um motor de busca que torna compatíveis todas as bases de dados. Foi um salto qualitativo muito grande.

PERFIL

Mário Silva Tavares Mendes, de 64 anos, nasceu na Anadia. Licenciou-se em Direito, em Coimbra. É juiz conselheiro jubilado. Em 2008, tomou posse como secretário-geral do Sistema de Segurança Interna. Foi director-geral da PJ e dirigiu o Centro de Estudos Judiciários.

in Correio da Manhã

200 países, 200 anos, 4 minutos

"Seja bem vindo quem vier por bem!"

“Esta terra que não me viu nascer e me acolheu. Fui eu que a escolhi mas não me rejeitou. Aceitou-me como sou, e por isso hoje, sou. Pertenço-lhe tanto que me pertence. Inspira-me. Respiro-a. Esta terra que me acolheu, viu-me nascer outra vez.” [anónimo]

A escassez de tranquilidade num ritmo de vida frenético deixa muitas famílias perplexas ao ponto de escolherem uma mudança de 180 graus. Sem tempo para si, sem tempo para a família, pessoas reféns de uma rotina angustiante que num dado momento decidiram dar um novo rumo à sua vida, abandonando a cidade para uma vila do interior de Portugal. Esta mudança traduz-se actualmente numa migração sem expressão do ponto de vista estatístico mas silenciosamente, a ideia vai conquistando os sonhos de um número crescente de gente saturada da vida urbana.

Um território sintonizado com esta tendência e preparado para acolher estas pessoas em busca do seu porto de abrigo, vai protagonizar um modelo de desenvolvimento inovador e duradouro. Trás-os-Montes e Alto Douro - território - é detentor de um cenário de mudança com potencial extraordinário. Para além dos recursos naturais e condições estruturais de desenvolvimento económico, os territórios promovem-se através da qualidade de vida que podem oferecer. A começar pela paisagem, interpelam-nos os contrastes, cores, texturas, sabores, clima, e claro, as pessoas. Elemento fundamental que cria, transfoma, produz e vive numa região que luta arduamente com a problemática da interioridade. Mas há algo que os nossos antepassados semearam e que continuamos a cultivar. A tradição de bem receber é uma arte que soubemos aperfeiçoar aliando o melhor que a terra produz com a sabedoria, dedicação e humildade das mulheres e homens desta região. Esta arte, devidamente capitalizada, pode determinar o futuro do desenvolvimento de TMAD. Os territórios de baixa densidade competem cada vez mais no campeonato da hospitalidade.
O desafio hoje e amanhã, é transformar a interioridade de um território num factor de atracção. Este interior de rudeza suave tem todos os atributos para criar raízes a quem as procura. Ancoradouro de valores identitários consistentes, Trás-os-Montes e o Alto Douro oferecem condições excepcionais para captar o interesse dos chamados novos povoadores.
Gentes de Trás-os-Montes e Alto Douro, vivemos num território inspirador, fonte de energia, um bem apetecível numa sociedade confrontada com tantos desafios e maiores incertezas. De braços abertos, receberemos quem, como nós, se apaixonar por esta terra.

Crónica de Alexandre Ferraz para a Revista Tribuna Douro
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